Relatório diz que Igreja Perseguida está esquecida no Ocidente: “Ninguém se importa”
Um dos líderes cristãos na Nigéria, que teve sua congregação atacada por terroristas em junho, deixando pelo menos 40 mortos, disse que a Igreja Perseguida está sendo esquecida: “Um genocídio está acontecendo e ninguém se importa”.
Andrew Adeniyi Abayomi, responsável pela Igreja São Francisco Xavier, na cidade nigeriana de Owo, estado de Ondo, conta que a igreja foi atacada num domingo por homens armados desconhecidos.
Na ocasião, ele observou com angústia que nenhum policial ou segurança nas proximidades foi prestar socorro, embora o ataque tenha durado pelo menos 20 minutos.
O ataque mortal consta no novo relatório da ACN (Aid to the Church in Need — Ajuda à Igreja que Sofre), com o título “Perseguidos e Esquecidos?”, no qual Abayomi escreveu o prefácio.
Milhões de cristãos estão deslocados por causa dos ataques de grupos extremistas. (Foto representativa: Portas Abertas)
Sobre o relatório
A pesquisa examinou 24 países, entre outubro de 2020 e setembro de 2022, mostrando que em 75% dos lugares a opressão ou perseguição aos cristãos só piorou.
Os países estão localizados principalmente na África, Oriente Médio e Ásia, e o relatório aponta que um fator para a piora do clima é a negação no Ocidente de que os cristãos são o grupo religioso mais perseguido.
A situação para os cristãos foi considerada pior em todos os sete países africanos analisados pela ACN, que citou a disseminação do extremismo islâmico e um aumento acentuado da violência genocida de militantes não estatais, incluindo jihadistas.
“O mundo se afastou da Nigéria”
Um país particularmente preocupante é a Nigéria, onde a ACN diz que o nível de violência contra os cristãos “passa claramente para o limiar do genocídio”.
“O jihadismo é uma das razões pelas quais a Nigéria está à beira de se tornar um estado falido, com a regularidade de sequestros, assassinatos de líderes cristãos e ataques mortais a igrejas.
O relatório destaca o terrível assassinato, neste ano, da cristã de 25 anos, Deborah Samuel, que foi apedrejada até a morte e depois incendiada após ser acusada de enviar uma mensagem blasfema pelo WhatsApp.
“O mundo se afastou da Nigéria”, relacionou Abayomi sobre a falta de reação da Igreja no Ocidente.
“A Igreja Perseguida precisa que as pessoas falem por nós. Para que a matança pare, mais organizações como a ACN precisam proclamar a verdade sobre o que está acontecendo com os cristãos em todo o mundo. Se não, seremos sempre perseguidos e esquecidos”, disparou.
Viúvas de cristãos que foram mortos na Indonésia e não sabiam onde enterrar os corpos. (Foto: Portas Abertas)
‘Intimidações cruéis’
O relatório ainda diz que a escalada da violência “muitas vezes visa expulsar os cristãos” e que, nos últimos dois anos, “os cristãos foram vítimas de algumas das campanhas de intimidação mais cruéis do mundo, orquestradas por militantes não estatais”.
Em Aksum, na região de Tigray, na Etiópia, acredita-se que até 1.000 cristãos tenham sido mortos em um massacre que os moradores dizem ter sido perpetrado por tropas da Eritreia.
“As ações do Estado atingiram os cristãos da África de forma prejudicial”, adverte o relatório.
No Oriente Médio, a sobrevivência de importantes comunidades cristãs no Iraque, Síria e Palestina está ameaçada pela migração contínua e, em algumas partes da região, a ACN adverte que os cristãos estão em uma situação pior do que durante a ocupação do Estado Islâmico.
“As evidências vieram à tona mostrando que a ameaça à sobrevivência de algumas das comunidades cristãs mais antigas do mundo se aprofundou significativamente.
O declínio é mais acentuado na Síria, onde, em uma década, os cristãos caíram de 1,5 milhão (10% da população) em 2011, antes do início da guerra, para talvez 300.000 (menos de dois por cento da população)”, citou também o relatório.
O ressurgimento do jihadismo e a diminuição da população cristã
No Iraque, a taxa de êxodo é mais lenta, mas a comunidade permanece frágil, com igrejas “lutando para permanecer abertas” e a população cristã diminuindo de cerca de 300.000 em 2014 antes da ocupação do Estado Islâmico, para cerca de metade desse número hoje.
A comunidade cristã no Iraque e em outros países do Oriente Médio “sente o perigo representado pela ameaça subjacente dos grupos jihadistas”, disse a ACN.
“Um ressurgimento do jihadismo tem o potencial de desferir um golpe decisivo para o cristianismo em seu antigo coração”, continuou.
Na Ásia, o autoritarismo estatal é o fator crítico por trás do agravamento da opressão contra os cristãos em Mianmar, China e Vietnã.
Cristãos que foram executados na véspera de Natal, em 2021, na Nigéria. (Foto: Portas Abertas)
‘A liberdade de religião está sendo estrangulada’
O relatório segue dizendo que “na pior das hipóteses, a liberdade de religião e consciência está sendo estrangulada”, citando a Coreia do Norte como exemplo.
“Entre os lugares onde a perseguição é impulsionada pelo nacionalismo religioso, o Afeganistão é descrito como “o pior infrator” devido à interpretação linha-dura do Talibã sobre a lei Sharia.
O relatório conclui que os indicadores sugeriram fortemente que, durante o período em análise, a perseguição aos cristãos continuou a piorar nos principais países preocupantes.
“O nacionalismo religioso e o autoritarismo intensificaram os problemas para os fiéis – incluindo o retorno do Talibã ao poder no Afeganistão, que levou os cristãos e outras minorias a tentarem uma fuga desesperada.
“A violência sistemática e um clima de controle fizeram com que em países tão diversos como Coreia do Norte, China, Índia e Birmânia, a opressão aos cristãos aumentasse.
“Ao mesmo tempo, apesar dos governos começarem a reconhecer a importância da liberdade de religião ou crença, a evidência deste relatório ‘Perseguidos ou Esquecidos?’ mostra que há um longo caminho a percorrer para garantir a liberdade dos cristãos e outras minorias em todo o mundo.
“Parte do problema é uma percepção cultural errônea no Ocidente que continua a negar que os cristãos continuem sendo o grupo religioso mais amplamente perseguido”.
‘Falem sobre nós’
Em seu discurso no lançamento do relatório na Câmara dos Lordes, o bispo Jude Arogundade, de Ondo, na Nigéria, pediu aos cristãos do Reino Unido que falassem sobre o que está acontecendo em seu país.
“Muitas pessoas estão realmente sofrendo”, afirmou ao revelar o grande impacto dos ataques em sua diocese. Ele disse que muitas pessoas estão pedindo ajuda à Igreja.
E a Igreja não nega ajuda a ninguém, segundo ele, que relatou ter estendido a mão às pessoas feridas e passando por sérias privações: “A diocese também concedeu bolsas de estudo a mais de 20 crianças de famílias que perderam o sustento devido à violência”.
“O governo não se importa com ninguém, é a Igreja que tem que carregar o fardo”, finalizou.
Sobreviventes de um ataque na Páscoa de 2019, na Nigéria. (Foto: Portas Abertas)